Carnaval em SP: o que deu certo, o que deu errado e os desafios para 2017
jussarasoares
A gente não queria, mas, sim, o Carnaval 2016 acabou. Foi difícil viver esta segunda (15) sem ter uma extensa programação de blocos para os próximos dias em São Paulo e não ter a perspectiva de voltar a usar uma fantasia tão cedo. Por outro lado, para produtores de blocos e Prefeitura já é hora de avaliar o que deu certo e errado na folia e a começar a traçar estratégias para 2017. Faltam ''apenas'' 374 dias para a sexta-feira de Carnaval do próximo ano. Se considerar o pré-Carnaval, o tempo é ainda menor.
Nas últimas três semanas, cerca de 2 milhões de pessoas, segundo dados da Prefeitura, acompanharam 355 blocos. O prefeito Fernando Haddad comemorou os mais de 400 milhões de reais de negócios gerados pela folia nas ruas, que recebeu um investimento de 10,5 milhões de reais. Ou seja, o Carnaval dos blocos já é mais lucrativo que os desfiles das escolas de samba, que receberam, neste ano, 44 milhões de reais (34 milhões de repasse para escolas e 10 milhões para infraestrutura) e rendeu 250 milhões de reais.
Esses números não devem ser exibidos apenas como prova do sucesso do Carnaval, mas servir de balizadores para uma organização antecipada e sem sobressaltos para 2017. É melhor para produtores de blocos, patrocinadores e foliões, cada vez mais dispostos a trocar suas viagens para o Rio de Janeiro, Salvador e Recife/Olinda para ficar em São Paulo. Vale lembrar que cerca de 40 mil turistas estiveram na capital para participar da festa. São apenas 2% do total de público ainda, mas com enorme potencial para crescer.
É preciso melhorar o planejamento e antecipar as inscrições dos blocos interessados em desfilar. O cadastramento para 2016 só foi aberto na segunda quinzena novembro de 2015. Os trajetos foram discutidos e alterados até às vésperas dos desfiles, como no caso do Bangalafumenga, Sargento Pimenta e Quizomba. Despejado da Avenida Sumaré para evitar o sufocamento da Vila Madalena, o trio foi levado ao Campo de Marte, mas, após pressão da Liga das Escolas de Samba, os três foram obrigados a desfilar na Avenida Tiradentes. O local escolhido às pressas não agradou produtores, que viram seu público minguar. Na Prefeitura, o endereço também será reavaliado, já que o trânsito é intenso por ali aos sábados.
O decreto que regulamentou a folia nas ruas, publicado em 8 de dezembro, teve como avanço em exigir apenas uma única autorização para a saída do bloco. Antes era preciso apresentar documentação à subprefeitura, CET (Companhia de Engenharia de Tráfego) e Policia Militar. De todo modo, o decreto também pode ser melhorado e discutido com organizadores de blocos. Alguns dos pontos mais criticados pelos diretores é em relação às regras mais rígidas para publicidade, o que dificulta na captação de patrocínio para os blocos.
Outra restrição imposta foi o tamanho dos caminhões de som: 3 metros de altura do chão ao piso onde ficam os músicos. Isso influencia diretamente no alcance do som durante a passagem de blocos, uma vez que quanto maior a altura onde os alto-falantes são colocados mais o som se propaga. Na redes sociais, a dificuldade de ouvir as músicas foi uma das principais reclamações. ''Não sei por quais razões a Prefeitura criou essa regra, mas acho mais perigoso porque isso faz com que as pessoas queiram se espremer para ficar mais perto do som'', observa o produtor Rogério Oliveira, da Pipoca.Co, responsável por organizar o Monobloco e o Bloco Bicho Maluco Beleza, com Alceu Valença, que desfilaram no Ibirapuera no pré-Carnaval.
Em termos comparativos, em Salvador (BA), terra onde os trios elétricos foram inventados, um caminhão de som ultrapassa os 5 metros de altura e opera em média com 350 mil watts, que empurram cerca de 300 alto-falantes, 50 amplificadores e 120 drivers. Um semelhante pôde ser visto na Avenida Faria Lima, durante o show da cantora baiana Daniela Mercury, no Aniversário de São Paulo. De acordo com Fábio Lopes, empresário do setor musical e presidente do bloco Não Serve Mestre, no Carnaval paulistano, mesmo os maiores blocos operaram com no máximo 100 mil watts. Já os menores, que contrataram os minitrios, tem potência de som ainda menor: 8 mil watts, o que seria suficiente para no máximo 2 mil pessoas se divertirem. ''A Prefeitura poderia ser mais maleável para 2017, fazer uma pesquisa entre os blocos e não criar uma regra única sem uma pesquisa técnica'', diz Lopes.
Em nota, a secretaria municipal Cultura informou que determinou a altura máxima geral em 3 metros, considerando fatores como a instalação da fiação elétrica na cidade de São Paulo e as linhas de trólebus, o que se tornaram limitadores de altura. Alguns blocos chegaram a obter a autorização para ultrapassar o limite de 3 metros, pois alegaram falta de carros de 3 metros no mercado. ''Estas especificidades da cidade farão com que o Carnaval paulistano forje uma identidade própria, assim como o Carnaval de Salvador e do Rio de Janeiro possuem suas respectivas regras, que se adéquam à realidade de cada cidade'', informou a nota.
A estrutura de banheiros químicos, limpeza e CET funcionou bem. Mesmo blocos pequenos tinham sanitários no percurso e a equipe de limpeza entrava em cena logo após a passagem dos foliões. Se houve xixi na rua, foi falta de educação mesmo. Em todos os blocos que o Blog do Bloco esteve, a CET acompanhou o trajeto e/ou sinalizou o percurso.
A fiscalização de ambulantes deixou a desejar. Embora a Prefeitura tenha aberto cadastramento para 4.000 vendedores, muitos operaram na irregularidade. Na Vila Madalena, homens e mulheres abriram o porta-malas dos carros e improvisavam um bar, vendendo caipirinha, vodca, catuaba e cerveja mais barata que os ambulantes cadastrados. Todos atuaram livremente sem a presença de fiscais.
O crescimento de Carnaval de Rua já faz o secretário de Cultura, Nabil Bonduki, pensar na criação de uma estrutura apenas para cuidar do assunto. ''A secretaria de Cultura está estrangulada em termos de sua capacidade de trabalho. Fazemos um grande evento de rua por mês. Já o Carnaval, um evento que reúne 2 milhões de pessoas, já tem a necessidade de uma estrutura específica'', observa.
O Carnaval de Rua ainda tem muito fôlego para continuar se expandido em São Paulo. Uma pesquisa da Spturis (São Paulo Turismo) apontou que 64% dos foliões participaram dos blocos pela primeira vez. Outro dado interessante: os blocos novatos, como Desmanche, Domingo Ela Não Vai e Tô de Bowie, que arrastaram multidões em pleno dias oficias de folia, mostram que o paulistano quer mesmo curtir o Carnaval por aqui e está em busca de boas opções. Por enquanto, os produtores dos blocos mais badalados têm optado por sair no pré-Carnaval, quando há uma enorme concentração de desfiles. Só neste ano, foram 139 em um único fim de semana, enquanto que nos cinco dias de oficiais foram 147. Talvez seja a hora de repensar o calendário e fazer Carnaval também no Carnaval.
O Blog do Bloco encerra a cobertura do Carnaval 2016 por aqui, mas já está pronto para falar de 2017.